GILLES, EDWARD E EU

A literatura aparece, então, como um empreendimento de saúde: não que o escritor tenha forçosamente uma saúde de ferro (…) mas ele goza de uma frágil saúde irresistível, que provém do fato de ter visto e ouvido coisas demasiado grandes para ele, fortes demais, irrespiráveis, cuja passagem o esgota, dando-lhe, contudo, devires que uma gorda saúde dominante tornaria impossíveis. Do que viu e ouviu, o escritor regressa com olhos vermelhos e tímpanos perfurados.

Gilles Deleuze, A literatura e a vida.

A solidão e a leitura, Edward Hopper.

FRÁGIL SAÚDE IRRESISTÍVEL
§
frágil saúde irresistível
febre malsã, rebordo do corpo
delineia a delicadeza
na ponta dos dedos
detidos em letras sem fim
aberto abismo
para meu riso
§
frágil saúde irresistível
me arrebata até a vertigem
me arremessa até a indecência
do absolutamente exterior
a mim, a tudo, a todos
incapazes de pássaros
e vôos
§
frágil saúde irresistível
volta, revolta, reviravolta
sintoma sem trauma
incurado, incurável
sem tempo pra viver
pra escrever grafismos rupestres
nas coxas noturnas do mundo
§
frágil saúde irresistível
entorna o corpo-mente
me atravessa
tumultua toda a paz
que possuo como morto feliz
me vitaliza, me tiraniza
mágico, trágico, autofágico

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