Quando leio ou ouço discursos ingenuamente catastrofistas sobre a sociedade contemporânea, quando leio ou ouço discursos ingenuamente laudatórios sobre as sociedades antigas ou sobre a civilização, quando leio ou ouço discursos ingenuamente triunfalistas sobre qualquer coisa, sempre recorro ao poema de Kaváfis do post anterior. Agora junto a ele o trecho a seguir, como aula de saneamento mental:
Nosso mundo é o das rotinas, o da banalização mais acabada que a história já conheceu: costumamos lamentar que assim ser perderam o poético, o heróico, talvez até mesmo o sentido atribuído às coisas e aos gestos. Essas críticas são tão frequentes que nelas nada se precisa alterar – embora, por outro lado, talvez o prosaísmo do mundo, sua redução ao banal, seja o preço a pagar por uma relativa paz entre os homens: a indiferença ainda é melhor que o entusiasmo, quando este faz matar e aquela permite a tolerância. Mas pode ser que o maior problema na rotinização do mundo seja que o próprio pensamento e o sentimento correm o risco de se banalizarem, se submeterem a uma eficaz e empobrecedora burocracia do mental.(…) Se perguntarmos, hoje, o que nos faz pensar, uma das melhores respostas será: aquilo que nos faz rir.
[Renato Janine Ribeiro, A última razão dos reis, p. 13]