Ou olho para dentro ou olho para fora, isto é, cedo a ruminações ou então aproveito os painéis de vidraça que só não dão para nascente… Sucumbindo a ruminações, a que aliás sou dado, eu não vou ter que encarar nem as vastidões do horizonte nem os abismos a que o lugar me dá acesso ou impõe, mas sim a vastidões e o abismo do tanto que não sei e queria saber sobre o Brasil e sobre as questões e a geografia que terei que encarar…
(…)
e sabiás nós não tínhamos, mas palmeiras sim, maracujá e fruta-pinha, e eram nossos, não eram portugueses, os siri-pipis e os catuituis pré-nacionalistas do Ernesto Lara Filho. Mas depois de 1975 até ficava mal revelar apego ao Brasil, fazia parte do ‘passado’ colonial (ainda hoje custa a lembrar esse papo multilusoracialotropicalista, de matriz brasileira, com que o colonialismo português nos andou a massacrar durante décadas), embora o Brasil dos coronéis tenha sido o primeiro governo do mundo a reconhecer a Angola independente e o seu governo, que se mantém até hoje no poder, ironias, às vezes duplas e até triplas, que a história tece.
[Ruy Duarte de Carvalho. Desmedida: Luanda, São Paulo, São Francisco e volta. Crônicas do Brasil. Lisboa, Cotovia, 2006, p. 53-4]