Vejo ainda coisas por dizer: em cada mudança
não somos já quem costumávamos; e quando mudamos,
é quem fomos que fica ainda por mudar. Um ser pode
ser tudo o que quisermos, se o tempo o deixar;
mas não será outro se entre ontem e hoje
se não souber transformar: pois é o desejo,
mais do que a fortuna, que faz com que sejamos
amanhã o que hoje não podemos ser; a não ser
que o amor nos prendsa à sua sorte constante. Então,
de dentro da alma, o sereno rosto procura novas
inquietações; e o teu riso o desperta de entre dias
e estações, convidando-o para a vida que é assim:
feita de mudanças, quando tudo vai ficar;
e insistindo em ser o que tinha de mudar.
[Nuno Júdice (1949 – ), poeta português, que tem a antologia Por dentro do fruto a chuva lançada no Brasil pela Escrituras, em 2004, de onde tirei o poema. Escreve no blog A a Z.]