Penso na poesia como uma forma particular de memória. Diferentemente da prosa, cuja narratividade mais ostensiva tem clara relação com a memória, a memória da poesia se dá por sinais mais oblíquos. Gosto de pensar que a poesia não lembra de nada além da própria poesia, criando assim redes de poetas e poemas de tempos históricos diversos. Não me refiro a poetas que lêem e citam outros poetas e/ou poemas, mas aos que se permitem dialogar com outros, propiciam esse diálogo, quase que nos obrigam a uma aproximação que, se não abole a história, namora com a memória história, memória da poesia.
No caso de Portugal, mar, viagem, desconcerto, sentimento de errância, decadência e mar fazem parte fortemente da memória dessa poesia; um texto servindo de epígrafe para o outro, um texto lendo o outro.
LUIS VAZ DE CAMÕES (APROX. 1570)
Errei todo o discurso de meus anos
e
É tudo quanto sinto um desconcerto
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CAMILO PESSANHA (1920)
Eu vi a luz num país perdido.
A minha alma é lânguida e inerme.
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FERNANDO PESSOA (1934)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
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FIAMA HASSE PAIS BRANDÃO (1975)
O mar não me confirma a mim.