A modernidade faz um esforço incessante para superar a troca: ela quer resistir ao mercado das obras (excluindo-se da comunicação de massa), ao signo (pela isenção do sentido, pela loucura), à boa sexualidade (pela perversão, que subtrai o gozo à finalidade da reprodução). E, no entanto, não há nada a fazer: a troca recupera tudo, aclimatando o que parece negá-la: apreende o texto, coloca-o no circuito das despesas inúteis mas legais: ei-lo de novo metido numa economia coletiva (ainda que fosse apenas psicológica); é a própria inutilidade do texto que é útil, a título de potlatch. Em outras palavras, a sociedade vive sobre o modo da clivagem: aqui um texto sublime, desinteressado, ali um objeto mercantil cujo valor é… a gratuidade desse objeto. Mas a sociedade não tem a menor idéia do que seja essa clivagem: ela ignora sua própria perversão.
[Roland Barthes, O prazer do texto, p. 34]
Ao contrário do que Barthes descreveu para a (já histórica?) modernidade, as sociedades contemporâneas conseguiram o fim do potlatch. Tudo tem seu preço, tudo tem seu valor e tudo tem alguma finalidade reprodutiva. Vivemos em tempos mais edipianos (e paranóicos) do que nunca. O inconsciente foi banido e toda perversão foi incluída, regulada e normalizada. Ou seja, não há mais perversões; assim como o Outro desapareceu, ao contrário do que se diz, pois quando todos são outros de outros ninguém (nem nada) mais é o Outro, e toda perversão passa a ser encarada como um simples, banal e reprodutivo papai-e-mamãe.
Estou no começo das Dádivas, ainda!
E querendo trocar ideias, ainda!