Desde o pós-guerra, a humanidade percebeu-se diante de seus limiares mais imanente e urgentes: de um lado, o incremento exponencial da capacidade humana em evoluir tecnicamente e controlar objetivamente o mundo ao seu redor e, de outro lado, a crescente consciência de que o sujeito humano se define pela imperfeição e sua incontornável capacidade de errar. E por que no pós-guerra? Porque os Campos de Concentração e Extermínio, bem como as Bombas de Hiroshima e Nagasaki, demonstraram que a evolução técnica da humanidade conduzirá logicamente à necessidade de exterminar a própria humanidade, causa de imperfeições, erros e desvios na evolução. Alguns poderão falar: não exterminar, mas fazê-la também evoluir a um charmoso pós-humanismo, que faça a igualdade e democracia se ampliarem, como pensam os partidos de direita e “esquerda” (aqueles que respectivamente negociam pelo ou com o mercado), ou o capitalismo quebrar, como cultivam os aceleracionistas. Só que não se percebe que o pós-humanismo é a continuação do mesmo humanismo moderno em outros termos, apenas mais tecnologizados, e isso nos leva a repetir de alguma forma o mesmo processo eugenista da segunda guerra, com uma seleção não-natural dos “mais aptos e melhores”, transformados em meros trabalhadores sobreviventes (e felizes por trabalhar), bem como também nos conduz ainda mais ao risco de catástrofes sociais (com levas de excluídos), ambientais, mentais (burnout, depressão e suicídios) e bélicas. Daí que aparecem hoje duas outras perspectivas de pensamento, alternativas ao pós-humanismo e intimamente ligadas ao atual estado político do mundo, embora ainda por serem apropriadamente descritas. Há um tradicionalismo reacionário – que bebe, mesmo que às vezes de modo involuntário, em muitas das águas que conduziram à filosofia nazifascista –, recuperando o pensamento de figuras apenas conservadoras, como René Guénon, ou grandemente asquerosas, como Julius Evola, aproveitando-se da falta de perspectivas que a aporia acima traz às pessoas. E há algo circulando por aí e cujo nome eu atrelaria ao pensamento ecopolítico e que conecta lições de povos tradicionais no relacionamento com o meio ambiente com a certeza de que o crescimento tecnoeconômico, mesmo de forma sustentável, jamais logrará repartir o bolo, defendendo-se então um decrescimento sustentável, uma governamentalidade planetária e uma relação mais orgânica e local com o meio ambiente e o meio comunitário, descolado da lógica das megamáquinas urbano-econômicas. De tudo isso, só lamento que muitas pessoas optem pelos estertores institucionais dos partidos, ao invés de se dedicarem ao mapeamento cognitivo e debate dessas e de outras linhas, pois são elas que guiarão cada vez mais o pensamento e a política de hoje em diante. Não tenho a menor dúvida.