Isabel de Sá é uma artista feliz. Não porque seja poeta e artista plástica, nessa conjunção se realizando qualquer espécie de complementaridade total de forças humanas. Forças não se completam. Multiplicam-se. Quando forças verdadeiras, alegres. Do contrário é tão somente impotência. Mas sua produtividade é verdadeiramente a da alegria. Alegria da obra plena. E plena porque sem recalques sai à rua para coletar resíduos, filigranas e restos de objetos que se dão como vínculos afetivos – afetos escritos e afetos plásticos. Arcaica sem unidades transcendentes. Moderna sem solipsismos das rupturas. Sua é a profundeza da pele, a manipulação de imagens, objetos e cores – colagens como desejos. Love boxes. Assim também com os poemas: pequenas caixas de amor. É isso o que se passa entre palavras e formas, imagens e representações no seu blogue.
A ESCURIDÃO DO ESPELHO, I
Só o lume dos teus beijos rompe
a treva onde a solidão nos mata.
Enrolamos a vida no escuro,
na semente de um amor atribulado.
Conhecemos o ritmo e a sede,
a convulsão do desamparo.
No sentido do corpo, no acerto
desce a força pelos braços
na violenta festa do prazer.
Tudo o que disseste
no desaforo da paixão
só podia incendiar a vida inteira
e encher de esperança o universo.
[Isabel de Sá, O brilho da lama, p. 29]