ética da resistência

Diante do risco da violência fascistóide, tenho lido muito se falar em “resistência democrática”. Desde antes das eleições, na verdade… Nessa expressão – mais do que a palavra “democracia” – acho que podemos pensar no que é resistir. Resistência não é fixação, enraizamento ou permanência no mesmo lugar – considerado um lugar exato, justo, conquistado e definitivo.  Muito menos avançar ou recuar, em gesto reativo ao poder. Não. Um filósofo já disse que resistir é liberar uma potência da vida, e como a vida nunca para, nunca descansa, nunca se interrompe, senão na morte e no poder, então liberar uma potência da vida é se mover, devir, transformar(-se), reinventar(-se). Daí a expressão “resistência democrática” só fazer sentido como uma oportunidade para reinventar, transformar, potencializar a própria democracia – isto é: aumentar as possibilidades do que seja a política, a esfera da ação e do discurso. E como fazer isso, quando as leis se tornam rígidas, ameaçadoras e violentas, ao invés de garantidoras da vida? Minha hipótese é… vivendo eticamente, vida como criação de possibilidades exteriores ao que é regido pelas leis – morais, legais, gramaticais, institucionais. A lei é sempre mais forte do que qualquer gesto que façamos contra ela, ela tem o monopólio da força e da violência, sempre teve. É nenhuma lei garante a vida sem ameaçá-la de alguma forma. A lei da vida, por outro lado, é a lei da transformação, da criação. Por isso, é necessário destituir-se da vida institucional, “abandonar” a vida institucional como modo de resistência, tornar-se invisível, clandestino à vida social regular, identificada e assumir a vida no seu fluxo incessante de criação – em ato e palavra. E criar é resistir, é esburacar os sentidos estabelecidos e obrigatórios, sentidos instituídos ou com desejo de instituir-se, para abrir brechas de vida, fluxos de ar puro, possibilidades não-fascistas, fazendo da existência um verdadeiro uso ético – fora de todo coletivo instituído, de todo partido, de todo grupo regulável ou rotulável.