aforismos

O que significa deixar sua marca em uma sociedade na qual marcas são criadas e descartadas à velocidade de um piscar de olhos e com a aparência de uma explosão de confetes? Significa marcar os que com você agenciam encontros afetivos, dedicados às intensidades infraleves da amizade e do amor, marcar os que se encontra sem outro fim além do próprio encontro. Significa não emular marcas sociais de violência institucional – com seus dispositivos legais, morais e tecnológicos – nesses encontros ao longo do dia e da vida, tornando as vidas mais singulares e verdadeiramente livres dos sacramentos e sacrifícios impostos pela vida pública. Quando o espaço público avança irrestrito sobre o privado – trocar pequenos segredos, criar jargões que se autodestroem e são esquecidos, expressar-se como uma criança que brinca – isso é resistir afetivamente, deixando uma marca de vida.

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A estética foi anestesiada pela gigantesca nuvem informativa que penetra nossos corações e mentes. E apenas pela interrupção discursiva podemos resistir a essa sobrevivência anestesiada; apenas um ato de criação é capaz de interromper o fluxo informativo; apenas por um ato de puro ócio da linguagem. A estética hoje só vale se ela for um resto de infância, uma absoluta brincadeira, diversão inoperativa e sem qualquer finalidade pedagógica. Somente aí ela pode se afastar do controle da vida sensível e se encontrar com uma verdadeira vitalidade política. A oferta e procura de diversão e entretenimento na cultura contemporânea, por outro lado, tornou-se sintoma de uma crescente carência de brincadeiras afetivas. O hedonismo hoje é vendido e comprado justamente pela impossibilidade de se vivê-lo direta e espontaneamente. Desde cedo, somos comprados por uma lógica perversa que nos sequestra o jogo como forma-de-vida e a forma-de-vida como jogo. Nossos gestos passaram a ser mediados e qualquer ação direta é velozmente julgada irresponsável e inconsequente. Mas é aí, e somente aí, que começamos realmente a viver esteticamente a existência.

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Toda afirmação na cultura contemporânea se dá a partir de uma negação primeira. Por isso, um pouco de negatividade no reino dessa pseudopositividade sempre gera um mal-estar, um medo de desordem na idealização a ser afirmada. Mas a negação de uma negação nunca é uma verdadeira negação, mas uma libertação, uma vida livre da moral e dos bons costumes, entre o prazer e a dor de uma pura vida afetiva. E isso assusta os viciados em poder.

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É preciso aprender a morrer para se poder viver. Não há outra forma de devir junto ao incessante fluir de noites e dias. Tudo o que quer nascer para a vida precisa aprender a morrer. O tempo e os livros são nossos grandes mestres nesse assunto. Mas as sociedades humanas, medusadas que são pela vida eterna, adulta e soberana, com uma ilusão de autonomia futura e consciência – recusam-se milenarmente a encarar a morte com a sabedoria que dela nasce, e com isso vivem em permanente estado de sobrevivência e esperança, as mesmas de quando se espera Deus – nesta ou noutra vida, pelo próprio ou outro de seus muitos nomes. Este é o caso do Brasil.